abril 26, 2012

Entrevista a Alírio e Edviges Rodrigues - Oleiros

VIDAS DEDICADAS A
PESSOAS E A OLEIROS



A conversa que aqui deixo escrita não foi a mais fácil de
escrever. Aqui e ali gostava  de ter o dom de reproduzir, em
poucas palavras, tantos sentimentos e áreas que se abordam.
Fica mais por dizer e escrever do que o resumo aqui
apresentado destas duas vidas. Para isso, só um livro.
Mas muitos que conhecem o Alírio e a sua
esposa Edviges, conseguem completar muito destas histórias,
porque dela fazem parte  ou a viveram conhecendo de perto
estes dois oleirenses. Confio  na vossa capacidade de,
mentalmente,  ir completando o que eu não escrevi.

Edviges dos Santos Salgueiro Rodrigues
 
Data do seu nascimento é: 05/6/1933
Filha única de Augusto Martins Salgueiro e Camila dos Santos Salgueiro que faleceram os dois com 92 anos.
É mãe de quatro filhas: Cecília Rodrigues; Clara do Céu  Rodrigues; Célia de Fátima Rodrigues; Edviges Rodrigues.
Avó de sete netos, a saber: Carolina, Samuel, Bárbara, António Augusto, Eduarda e Alexandre e Camila.
 
Exerceu a função de Professora Primária desde 1958 iniciando na escola de Azenha de Cima (Sarzedas) – 2 anos como agregada e mais dois já na qualidade de efetiva. Seguiu-se Penha Garcia (Idanha-a-Nova) depois Passaria (Sertã), Várzeas, Estreito e finalmente Oleiros. Destas escolas e lugares, gostou imenso a de Penha Garcia. Confessou-nos que a colega que mais admirou foi a Professora Eulália (esposa do Dr. Brandão, do Roqueiro e médico em Oleiros)
Em termos de devoção, venera dedicadamente a Senhora da Conceição, padroeira de Oleiros. A nossa entrevistada tem um passado de muita entrega e participação  no domínio da religião cristã. Sempre pertenceu à Acção Católica e atualmente faz parte do Grupo de adoração do Santíssimo Sacramento e também do Grupo Movimento Carismático.
 

Não podíamos deixar passar esta oportunidade sem lhe colocar a seguinte questão:

LM (Luís Mateus)- Todos reconhecem em si  uma presença pontual e por isso lhe estão gratos pela voluntariedade de estar em todos (ou quase todos) os velórios. Tem alguma razão especial para o fazer?

ER (Edviges  Rodrigues) – A minha ida aos velórios tem a seguinte história e que muitos desconhecem: uma vez, já lá vão muitos anos, fui a um velório em que a igreja da Misericórdia estava completamente cheia. Passado algum tempo, fui a outro onde só se encontravam menos de meia dúzia de pessoas.  Fixei o meu olhar no fundo da igreja e meditei nestes dois factos. Ou seja, no velório da pessoa rica, importante, a igreja estava repleta, mas no da velhinha pobre já estava quase vazia. Aí decidi, enquanto Deus me der saúde acompanharei todos salvaguardado, evidentemente, a minha saúde e o meu trabalho (é que ainda dava aulas quando esta situação aconteceu. E dei ainda durante vários anos).No trabalho nunca ninguém sabia que eu tinha perdido a noite.
Olhe, uma vez, estava para ir a um velório e senti uma força que me mandou para a cama até o meu marido estranhou esse meu regresso. A questão põe-se: poderei deixar de ir?
LM – A propósito ainda de velórios e porque deve ter uma opinião formada sobre a questão que lhe quero colocar, acha bem que a igreja onde é feito o velório encerre por exemplo à uma da manhã e reabra ao outro dia cedo, ou acha que deveria estar toda a noite aberta?
 
ER - Acho bem que fechem à noite e abram de manhã. E sabe porquê? Porque é difícil aguentar uma noite inteira ali sentados sem dormir e mal sentados. Quase ninguém aguenta, uns dormem e ressonam enquanto outros conversam ou rezam. A questão é aí que se levanta: o que será melhor? No meu entender e respeitando o sentimento de todas as pessoas, mas digo: Olhem pelos vivos!

LM – Sei que visita bastante o Lar de 3ª idade da Santa Casa de Misericórdia. Gosta de o fazer ou  é por ter lá alguns familiares?
 
ER – Já em Castelo Branco, quando andava a estudar, ia com um grupo de colegas visitar os velhinhos e os doentes no antigo hospital. Talvez pelo facto de os meus pais terem falecido já com uma certa idade e pode ter aumentado a minha atracão e vontade de visitar os mais velhinhos. E continuo a visitar o Lar e os doentinhos. Sinto-me feliz quando lá vou e noto neles a sua alegria e satisfação.

LM – Mas… curiosamente a Edviges também sempre se relacionou muito bem com os jovens. Isso deve-se a ter sido muito tempo professora de crianças?
 
ER – Sempre gostei muito de criancinhas é verdade mas, sabe, talvez porque já em África só brincava com negrinhos, filhos dos criados e, na escola, eu era a única branca. Sou muito dedicada às criancinhas e tenho uma certa amizade pelas minhas antigas alunas, algumas delas estão hoje bem formadas na vida e, isso, é muito gratificante. No geral, concordo com o que diz: tenho uma certa capacidade natural de me relacionar com as pessoas independentemente da idade.

o casal com as quatro filhas - foto LM
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 ALÍRIO DA SILVA RODRIGUES

 
Nasceu em 5/6/1938 tendo, naturalmente agora 73 anos.
É filho de Manuel Rodrigues David (o Manuel Seladinha) e de Cecília da Silva.
É irmão de José da Silva Rodrigues, residente em Tomar, e também de Maria da Conceição Martins (já falecida) que foi casada com o “José da Póvoa de Minau”, pessoa bem conhecida em Oleiros.
Estudos: Na primária frequentou as seguintes escolas:

- Na que existiu no antigo hospital frequentou as 1ª e metade da 2ª classe  e,  o resto,  na actual escola até obter a 4ª classe, cuja professora diz ter sido sempre a Dona Adélia.  “Era mesmo uma santa”.
- Seguidamente foi para Tomar estudar na Escola “Jácome Ratom” Industrial. Seis anos com estágio incluído.
Entrou na vida ativa do trabalho, na loja do pai na conhecida mercearia com bomba de gasolina à mão até 1961. Hoje é uma cabeleira moderna. Nessa altura, mesmo em frente situava-se a prisão e que hoje é uma instalação nobre instalação camarária, mais concretamente o anfiteatro da Casa da Cultura de Oleiros.
 
Em 24 de Julho deste ano morre a sua mãe e oito dias depois vai para Lisboa para trabalhar na Direção-Geral dos Serviços de Urbanização de Lisboa (Plano de Lisboa). Esteve ligado a este projeto durante sete meses.
Casou em 1962 ficando a morar em Oleiros. Em 1967 entrou para a Repartição de Finanças. Começou por ser escriturário e foi subindo até chegar a chefe de repartição de 3ª classe. Reformou-se em 1994.
Mantém boas recordações do trabalho na Repartição e com todos os colegas com quem trabalhou. Diz-nos o amigo Alírio que “houve alturas em que o pessoal das Finanças chegou a pagar o bilhete de autocarro de alguns clientes” o que mostra a sensibilidade e conhecimento das pessoas do concelho.
 
Com algum atrevimento perguntámos se conseguia eleger uma figura oleirense que o tivesse marcado.
A resposta foi pronta e sem qualquer hesitação: “foi, sem dúvida, o Sr. Augusto Fernandes, porque foi um indivíduo que, simplesmente com a 4ª classe, conseguiu criar o império da resina e também não permitiu que houvesse falta de pão, depois da 2ª guerra mundial em Oleiros. E este facto marcou-me bastante”. Curiosamente, nesse período, era eu que tinha a responsabilidade de cortar as senhas que seriam entregues nas mercearias. É que nesta altura tudo era racionado e só com estas é que as pessoas podiam levantar os produtos.

LM - O Alírio pertenceu muito tempo aos Bombeiros Voluntários de Oleiros. Pode relembrar-nos esse tempo e essa dedicação?
 
AR (Alírio Rodrigues) – Estive 29 anos de serviço no corpo activo e ainda mais seis anos como Presidente da Direção e praticamente uma dezena de anos como vogal da Direção. Uma vida ao serviço dos bombeiros e das populações. Foi da minha responsabilidade a construção do pavilhão onde se guardam os autotanques e também a construção da cozinha nova. Deixei ainda  o projeto do edifício das camaratas pronto restava fazê-lo. A direção seguinte recebeu o financiamento e mandou fazê-lo. Enquanto bombeiro foi ainda da minha  responsabilidade a criação da Fanfarra dos Bombeiros que começou com 13 elementos além de ter fomentado a prática do atletismo tendo constituído 1ª equipa masculina e outra feminina, que a nível Nacional conquistaram para a Associação cerca de 60 trofeus, que se encontram em exposição na vitrina do Bar. (como nota de curiosidade relembro a prova feminina efetuada em tomar em que colocamos 7 atletas nos 10 primeiros lugares).
- Fui instrutor do Rancho Folclórico e executante instrumental.
- Fui vice provador da santa casa de Misericórdia.  

LM – Se lhe pedisse a descrição de um episódio durante toda essa vida de soldado da paz (bombeiros verdadeiramente voluntários), o que nos contava?
 
AR – Tenho uma pequena história que até consta do livro que foi editado pelo 50º aniversário da Associação dos B.V. Oleiros. Tem como título:

                       “A cabrito dado … não se olha ao tamanho”
 
“Havia um incêndio, lá para os lados da Corujeira.
Andava um grupo de bombeiros a tentar dominar a frente do incêndio, quando o Alírio, como bombeiro mais graduado presente, dá ordem de lançar um contra-fogo. Só que, aparece um habitante daquela localidade (agora já falecido) a opor-se e a barafustar contra a ordem dada.
O Alírio, mantendo a sua autoridade, na circunstância, lança o contra-fogo e, pouco depois o incêndio é dominado e extinto.
No dia seguinte , aparece-lhe à porta o habitante discordante, a agradecer por lhe terem salvado o pinhal e, levando um cabrito, como sinal de agradecimento.
Aceite a oferta, o Alírio entendeu partilhá-lo com os restantes bombeiros do grupo e, assim fez. Mas como um só cabrito era pouco para tantos, resolve comprar, à sua custa, mais um, que então deu para todos.
Moral da história: Em vez de compensado, acabou por ser “… embora voluntariamente ”cravado” 

LM – Participou de mais alguma Associação ou Grupo ?
 
AR – Sim, fui Presidente da Direção da ARCO durante dois mandatos.
 
LM – O Alírio está ligado a uma história conhecido a nível regional, nacional e até internacionalmente. Estou a falar da “santa que chorava sangue”. Podemos relembrar esse episódio?
 
AR – Foi por voltas de 1998, no dia 2 de Maio, estava eu a dormir de manhã e comecei a ouvir  barulho fora do normal na minha rua e a minha esposa chamou-me para verificar à janela que, a vinte metros da minha porta, estava um conjunto de pessoas à espera de poderem ver o “milagre” da santa chorar.
Até aí não tinha tido qualquer informação. Nunca acreditei no que me diziam. Mas decidi ir ver, dias depois. Nessa altura a santa já chorava sangue em vez de água, como acontecia nos primeiros dias. Mas não fiquei convencido. Chegou-se ao ponto em que a imagem da santa já chorava a pedido das pessoas que estavam cá fora. O fenómeno foi noticiado a nível nacional e chegou além fronteiras. Dias depois já eram excursões, atrás de excursões, com pessoas que deixavam todo o tipo de jóias, fios, anéis etc. junto à imagem. Por mim, aquilo era uma autêntica fraude e tive de tomar algumas atitudes que levassem à descoberta da fraude.
Mandei até fazer uma análise ao sangue, à minha custa, mas não era de sangue humano.
Este caso meteu investigação da PJ e Ministério Público. Isto foi tudo mesmo rocambolesco acabando por existir processo mas tudo parece ter terminado em “arquivamento”.
 
LM – Mudando de assunto: vermelho, verde, azul ou outra cor?
 
AR – “Lagarto”, logo verde, porque sou dos tempos dos cinco violinos: Travassos, Jesus Carreia, Vasquez, Piroteu e Albano.
 

Nota: este casal agora entrevistado, como se costuma dizer, conhece já meio mundo. Fizeram as viagens que mais gostavam de fazer. Visitaram vários  países, santuários e outros locais muito frequentados por qualquer razão histórica ou mesmo autênticas maravilhas da natureza mas, para não nos alongarmos, não faremos a relação desses locais e dessas viagens.                                          
                                                                          Entrevista realizada em Abril de 2012
                                                                          Por: Luís Mateus



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